quarta-feira, 29 de junho de 2011

Comentário sobre o filme ''Meia noite em Paris''



Meia noite em Paris 


 A retratação de um tempo passado encontra na literatura um campo mais fértil para produzir um resultado eficiente .Em um filme, a transposição das situações ocorridas no passado precisa estar afinada ás demarcações de figurino ,a maneira como a fotografia privilegiará os cenários a serem mostrados. O escritor se vale mais do seu recurso enquanto manipulador da realidade mostrada.Não há a necessidade de uma reconstituição rigorosa,tudo irá depender da capacidade vinda da imaginação do autor em tirar do  contexto  histórico escolhido um caminho capaz de seduzir o leitor.No cinema a imagem deflagra as escolhas demarcadas pelo diretor capazes de seduzirem o espectador.Pode se optar pelo rigor na elaboração da direção de arte  e também de como a linguagem contida na capacidade técnica do cineasta irá traduzir os fatos de uma época essenciais à história narrada.No filme‘’Meia noite em Paris’’, o diretor Woody Allen está empenhado em questionar a nostalgia dos tempos não vividos,as eras cujos grandes feitos artísticos são supervalorizados em detrimento aos fatos históricos registrados.A opção do realizador nova-iorquino projeta uma Paris idealizada,a Cidade da Luz dos anos 20,povoada por figuras fundamentais em suas áreas de atuação  artísticas.Porém,a narrativa pela qual tais personagens transitam é pobre.
  Ao transmitir a um jovem e bem sucedido roteirista americano de Hollywood o protagonismo do filme, se transfere a visão do turista capaz de embarcar em aventuras visando se inspirar. Tal predisposição em busca do novo facilita o choque com os fatos presenciados pelo personagem, em vias de se casar com uma mulher fútil, rica e dominadora. A antítese do modelo de mulher parisiense buscado pelo confuso homem.
  Tal composição monótona só é quebrada com uma viagem ao tempo,a perambulação pela Paris dos anos 20.Os seus anfitriões são personalidades como F.Scott Fitzgerald,Ernest Hemingway e Gertrudre Stein.É uma idéia brilhante,mas mal executada.Todas as  figuras históricas remetem a um arquétipo do artista exótico,maluco e genial.É mais palpável ao cineasta mostrar  Zelda Fitzgerald como uma neurótica e o Hemingway como um beberrão ultra masculinizado e marrento do que elaborar um perfil psicológico mais caprichado.Isso nada tem a ver com o tempo de exposição conferido a cada personagem e sim pela opção destinada a vincular pintores do porte de Salvador Dalí e Pablo Picasso como figuras  exclusivamente excêntricas .O clichê foi sempre buscado,interessava era mostrar o convívio do americano do séc. XXI com os malucos beleza da década de 20.
Tecnicamente, a fotografia não capturou as muitas angulações de uma cidade vocacionada a deter variedades de registro. A direção de arte é tímida ao se considerar os apelos contidos na ambientação das cenas reproduzindo os cafés e casas da época retradatada. De nada adianta um elenco talentoso frente a uma situação assim verificada.
 O filme ‘’Meia noite em Paris’’ me fez encher de sentimentos variados em relação à próxima obra de Woody Allen. Um dos sentimentos mais fortes é que ele desista de filmar no Rio de Janeiro.   

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Crônica-Encontro no café

  A tarde estava fria demais para ser comum. A constatação não era medida pela temperatura, começou a ser definida a quebra dos meus hábitos rotineiros quando eu avistei da esquina o meu boteco fechado. Além de estar num outono disfarçado de inverno, calhava daquela tarde ser feriado e o meu boteco tem um grande movimento à noite , principalmente na noites que adentravam a madrugada antes de um feriado.Para não perder a viagem eu toquei a minha cadeira de rodas para o café ao lado do meu escritório.

 O local estava habitado , sem estar lotado. Todo o clima da rua conferia serenidade. O movimento de carros estava abaixo do normal , as buzinas não eram sequer ouvidas e muitas famílias passeavam , alheias a qualquer possibilidade de estresse. Talvez, essa impressão tenha ficado mais nítida assim que fiz o meu pedido e avistei a harmonia de um casal de jovens e sua filha, um tesouro de no máximo três anos. A distância da minha mesa não permitiria ouvir a conversa dos pais, mesmo porque as reinações da filha logo me encantaram.

   A menina não estava vestida de fada , não brincava com a sua comida , muito menos fazia barulho.Acreditem, parecia ser uma criança de quase três anos calma. Bastou chegar uma senhora levando para passear o seu poodle,cuja vestimenta  remetia mais a de uma paquita do que uma cadelinha. Não acredito que houvesse um conhecimento prévio por parte do entusiasmado casal e a senhora.Os cumprimentos formais indicavam uma simpatia de etiqueta , enquanto a afinidade entre a criança e a cachorra ,agora começando a saltar , foi instantânea. 

 Os carinhos trocados entre a menina e o animalzinho latindo mudaram o status do refúgio do café para abrigar uma farra. Durou o pouco o momento , a garotinha levou alguns festejos e uma lambida da poodle paquita. . As poucas pessoas ao redor riram da cena.A mãe delicadamente colocou a filha no colo. A senhora entendeu o código , polidamente se despediu e seguiu o seu caminho . A cachorra obedeceu  o comando e interrompeu o latido. Achei isso ótimo , pois aquele ruído me fazia sentir saudades das buzinas ensandecidas. A linda garotinha distribuía sorrisos e , vívida, foi atrás do cão guia.Zelosa a mãe foi atrás de sua filha. Eu fiquei nostálgico de mim mesmo.

  Não foram os passos faceiros da linda menina que remeteram à minha imobilidade física , e sim o de não registar os fatos como aquela criatura de quase três anos lançava diante do seu universo.Um olhar franco, incapaz de comparar 'uma' poodle a uma paquita e buscando o novo. A nostalgia deu lugar a um sensação mais palpável ; a do frio prenunciando uma noite gélida.

 Tratei de pagar a minha conta revestido de disposição , agradecido por testemunhar essa ação e tramando a minha volta ao boteco , mesmo computando o buzinaço como fator integrante ao lugar. Bom mesmo era poder transitar em realidades diferentes e complementares na mesma rua.Fui feliz para casa.

Um abraço PARATODOS!

André Nóbrega.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Crônica- Novas estradas

 O processo de reabilitação para um cadeirante não é medido somente pela quantidade de suor gasto, o esforço empenhado que visa um recondicionamento físico. Todo o sacrifício será insuficiente se não vier acompanhado por um esforço permanente de autocontrole. Não é uma regra , um conselho, apenas um relato comum ao meu processo de integração frente às ocorrências cotidianas.

  Às vezes, todos os componentes incluídos em um dia apontam condições favoráveis. Os sinais do tráfego parecem mais demorados e atravessar a rua fica mais fácil, prazeroso até. As pessoas na rua lhe sorriem mais, elas notam em você uma abertura para uma alegria sincera, predisposta à troca e você acolhe essa energia projetando maravilhas para o resto do dia , da semana. Neste embalo, os buracos e terrenos irregulares da rua são insuficientes para atrapalharem a sua força, a incomparável vontade de superação da qual você, acreditando ser um super-herói, embarca cheio de confiança. Basta um simples lance de escadas impedindo o super-homem de chegar ao destino desejado para a realidade tomar forma, como se a dificuldade em realizar coisas 'fáceis' nos tornasse improdutivos, estéreis e inválidos. Muitas vezes fica difícil ao próprio cadeirante não se sentir assim.

 Mas o dia não estava bom? As coisas não corriam bem, seguindo um percurso favorável? Sim,sim. As pequenas pedras no sapato são as que mais incomodam. Sempre haverá algum fato lembrando a limitação sujeita a qualquer portador de deficiência adquirida.Trocar lâmpadas?Pegar o livro no alto da instante?São atividades que não requerem uma habilidade especial.Devido a isso, haverá um imã remetendo o quanto aquelas ações eram feitas por você facilmente, sem hesitação alguma. E agora , mané??

 Enche o saco a obrigação de servimos de exemplo, provarmos o quanto somos guerreiros, quando no fundo o desejo por reconhecimento profissional, falar besteiras e promover trocas de afeto(yes, nós temos saliências!) nos é comum a qualquer cidadão andante.

 Consciente da reabilitação física e dos sacrifícios incluídos ,o difícil é operar uma reabilitação existencial. Fazer a CPI das questões que lhe empatam , sem esquecer das alegrias e dádivas presentes no caminho de qualquer pessoa.

 É fundamental promover a construção de novas estradas capazes de ultrapassarem as escadas. Exercício do braço, do agir e de assumir quem nos tornaremos. Muito difícil , porém as licitações para obras estão a pleno vapor.

  Um abraço PARATODOS!

  André Nóbrega.

domingo, 19 de junho de 2011

Crônica-Presentes de Chico.

  O compositor e escritor Chico Buarque completa 67 anos hoje.As homenagens e louvações serão  bem vindas, sim senhor!!Seja através de assobio, serenata ou menção a sua poesia, nesse domingo junino estaremos de alguma forma todos de Chico.

  Agradeço ao meu pai pela interlocução junta à obra desse ícone da MPB. Eu me recordo bem do dia.A data já era solene; era véspera de Natal. Navegámos pelo ano de 1996,  naquela hora em que ninguém, além daquela ansiedade comum à data, se fazia anunciar. Eu era um garoto imberbe, començando a brincar com as palavras, fazendo versos sofríveis e achando o mundo um quintal para práticas melancólicas.Um adolescente bobo, começando a ficar com fome e entediado.Meu pai interrompeu o fastio colocando um CD.

  -Preste atenção nisso!-Eu concordei já esperando pelos acordes de ''Noite Feliz'.Eis que o piano de Cristovão Bastos vai ganhando a sala, preparando para a voz de João Nogueira chacoalhar tudo que remetia ao marasmo , aos lugares comuns contidos nas antevésperas de festividades e à minha chatice juvenil.O álbum era destinado à obra de Chico Buarque. Um nome muitas vezes citado , não devidamente presenciado como passou a ser a partir daquele dia.

  Ouvindo clássicos como ''Noite dos Mascarados'',''A Rita'',''Samba e amor'', o meu pai começou a querer explicar as letras do Chico, embora , se tratando da fineza e simplicidade evidenciadas nas canções, isso não fosse tão necessário.  

  O percurso musical estava redefinido. O citado álbum possuía uma pegada de samba, em virtude da inconfundível vocação do saudoso mestre João Nogueira.Eu me predispûs a pesquisar tal tesouro , aquela via de poesia flagrante, palpável e vergonhosamente desconhecida pelo aficcionado por Renato Russo, o meu ídolo rockeiro que havia morrido fazia pouco tempo.Eu estava orfão de ídolos e carente de poesia cantada. Acolher aquela valiosa dica do meu pai visando conectivos poéticos relevantes foi fundamental.

  Daí ao compositor engajado, o desbravador fideldigno da alma feminina houve uma reeducação sentimental . No carnaval do ano seguinte eu já sabia cantar a letra de ''Vai Passar'' inteira! Ahhh molequee!!

  Agradeço ao meu pai pela sabedoria do seu nobre gesto, ao João Nogueira e Cristovão Bastos por terem sedimentado o encontro e ,é claro, ao Chico Buarque. Não posso deixar de prestar um apreço pelo meu amigo oculto da noite de Natal. O CD da dupla '' Claudinho e Buchecha'' mostrou que a busca por novos gêneros musicais precisava ser iniciada.

 Um abraço PARATODOS!!

 André Nóbrega. 

segunda-feira, 13 de junho de 2011

Poema- Maria e Esther

Maria e Esther

A filha da Dona Maria é ingrata
Queria a menina o mundo às suas custas
com isso era dada a mimos e bravatas
A jovem Esther, sorria.Dona Maria rezava.
Até que vieram os quinze anos de Esther.
As amigas debocham de Maria,pois aquela
 data careta para a Esther menina prejudicava
o desabrochar da Esther mulher. Justiça
Seja feita, a insistência da senhora animou
 a filha e alertou as amigas da menina.
A festa animava Esther nas coisas mínimas
Os chamados caprichos de mulher.Comida
E bebida era Dona Maria quem cuidava. Esther
Respirou dia e noite a cerimônia , enquanto as amigas
Já não tão íntimas,acompanhavam a história.
Chegado o dia da festa, o irmão de Maria empresta
O largo quintal.Salgados,doces e tamanho capricho
Ninguém do bairro soubera de igual. Maria corria
De felicidade , o suor na testa de Esther manifesta
Um estranho sentimento. Havia o prenúncio de glória
Faltava era gente. As horas ,o vazio...Isso conferia
Ao evento um gosto de peças querendo trabalhar
Onde tudo implorava contratempo . O anúncio da valsa fez
Esther compreender tudo. Quintal vazio, comida farta
E uma vivência apta ao fastio. Maria acolhe a filha
Para germinar as lágrimas perdidas. A garota é uma
Ilha .Vão as duas nesse enredo confuso,mudo á alegria
Também intruso ao investimento da data.Naquela noite
Maria viu em Esther uma capacidade inédita.Alheia ao
Choque, a estéril visão debutou anestesia ao orgulho.
A dor e a decepção juntas , feito uma ação mística
Conferiram nova música a situação. As mãos trêmulas
De Esther não sabiam ,mas Maria entedia no toque
Da filha o murmúrio consciente da transformação.
Ainda que aflita,a espera da menina pela festa
Tornou evidente a passagem para a Esther mulher.
Silenciosa, Maria a confortou.Ela estava recheada 
pelos esforços feitos para ajudar a menina, até bem
pouco ingrata.Sem nenhum plano ,a festa de quinze anos
transformava em verdade a ação da lagarta em borboleta.
Abriu-se a fresta ao dócil aprendizado. Percorrendo em cada
Idade ,está por debaixo dos panos,um atalho de superação.
A qualidade aceita por Esther ,esteja onde estiver há de
Lhe conferir contágio e preparo . Sem receita ,tem mais a crer
Quem trabalha.Antever o destino é castigo impreciso.Traga
Consigo a coragem de percorrer, ademais a carga de perdas.
Torna-se teimoso ao que queiras, tolerante ás quimeras.
Maria e Esther convivendo, cúmplices nas mudanças.
Assim como nós todos tentando consentir a mais sincera aptidão:
A de continuarmos tentando.
                                                   RIO,13 DE JUNHO DE 2011.

sábado, 11 de junho de 2011

Poema- Rancor


Rancor

Via nas tuas tramas tamanho desprezo.
Entrevo para o que não chamas
De amor, favor egresso da tua dúvida.
Ela faz compor ao veto indigesto da cama
um protesto aliando tua descompostura.
Portanto,não peça calma.Se sou cria
Dos teus berros, não comece a medir
nos porres a única parceria .Há nos poros
Uma relevância aos erros,supremacia
Colhendo os olhos ternos,sedentos e talvez
alheios à nostalgia.Daqui por diante,os termos
de nossos planos serão todas manobras suicidas.
Desmonte rodeios que eu bloqueio a sua vinda.
Desmanche os floreios sutis e catalisadores,a escória
Do desejo a quem escolha o medo e acolha
Tanto verniz.Prendo-me agora aos piores fatos.
Aquela falta de tato do teu sorriso farto
matando a espera como quem diz sem aviso:
-Sofra!
Pois eu entendo os teus passos tímidos
Foram todos falsos, cactos diante das futuras
 safras.Maldita essa estrutura rígida tua.
A escrita formal de tantos recados dúbios
anunciando o dever de mentir,manter a armadura.
Sou tolerante á loucura .Incoerente somente quando
sem liberdade ,tua lembrança disputa prazer com
amargura.
Não há mais rompantes nessa restrita escolha
Madruga no corpo a maldita condição imposta.
Refém a retina de breu,íntima do gozo composto
Por névoas, a minha escuta define o caminho
Da tua crença por minhas chagas minimamente
                                                                            [expostas.

RIO,11 DE JUNHO DE 2011.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Poema- Licença poética

Licença poética


O lado sombrio e insano
Ocorre quando rio e reclamo
Da falta de sal na comida
-  geralmente farta-
Chorar justifica ao lírico
Um poema reconhecido
numa noite rende de fuga
 Muita carícia aos amantes
Mas quem na rua dialoga
Com o cobertor e caixotes
Quando este vagaroso acordar
Não fará do amanhecer
O poema de primavera .
Tenho muita pena do tédio
E das pernas paralisadas
Porque o assédio da solidão
Faz juntas fraternas se esvaírem
Aos poucos em gritos tímidos.
O rito é uma engrenagem seleta.
Mas para cobertores curtos
Todos os muros são justificados
Nessa paisagem de fome e desapego
A dor não se refugia na estética
E o cinismo das minhas madrugadas
Não pode ser confundido com
   LICENÇA POÉTICA
RIO,02 DE NOVEMBRO DE 2009.